amores expresos

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Só chego atrasado


A porta do meu apartamento, com lâmpada em curto



Descubro com três dias de atraso, lendo o St Petersburg Times, o semanário local em inglês, que o enxadrista campeão mundial e atual líder de oposição Garry Kasparov veio a São Petersburgo participar de um protesto ao lado de cinco mil pessoas contra o projeto de construir um arranha-céu monstro para sediar a gigante Gazprom no centro histórico da cidade. No mesmo dia, 120 casais de jovens, convocados por meio de torpedos de celular, se reuniram na esplanada do Palácio, em frente ao Hermitage, para se beijar, todos ao mesmo tempo. Não vi nenhum dos eventos, mas a quase simultaneidade dos dois dá uma boa medida do que é a Rússia hoje. No domingo à noite, uma carreata de jovens, com bandeiras negras (algumas com caveiras) e as namoradas louras penduradas e gritando das janelas dos carros, passou buzinando pela Niévski. Deve haver mesmo coisas geniais acontecendo em São Petersburgo. Pena que eu não as vejo. Tenho a impressão de estar passando ao largo (ao menos, consegui comprar ingressos para a apresentação única do balé Forsythe no teatro Mariinski e para o “Platonov”, de Tchecov, dirigido por Lev Dodin, no teatro Mali – mas tanto um como o outro só vão acontecer daqui a duas semanas). Cinema, só em russo ou dublado em russo. As duas únicas livrarias da cidade que vendem livros em inglês são um lixo. Parece não haver arte fora do Hermitage. O “centro cultural” dos alternativos fica, como quase tudo aqui, escondido nos fundos de um pátio caindo aos pedaços. Reúne um “museu de arte não-conformista” (ainda estou para achar o de arte conformista e aí poder tirar as minhas próprias conclusões com base na comparação), o primeiro bar “underground” da cidade e uma sala dedicada a eventos experimentais (shows, festas etc.). Tenho que voltar para conferir quando estiver aberto. Porque, onde quer que eu vá, tudo está sempre fechado (ou já acabou – quer dizer: está fechado para sempre). Devo estar indo nas horas erradas. Confesso que, embora goste muito de John Lennon, uma placa na porta do centro cultural alternativo, em homenagem ao compositor de “Imagine”, não me convenceu a voltar. Ainda mais porque tudo demanda esforço. E para chegar até lá tenho de pegar uma “marshrutka” (o lotação local) e gritar em russo na hora de descer (já que não há paradas fixas). Em geral, confundo os termos. Quando quero dizer “com licença”, digo “até logo”; quando quero dizer “bom dia”, digo “por favor”, e quando quero dizer “pare”, peço desculpas. De modo que só desço quando o motorista (ou outro passageiro) quer – e tenho de fazer o caminho de volta a pé.

6 Comentários:

Blogger Ronnie K. disse...

E será que em meio à essa confusão toda, "perdido" num país estrangeiro do qual não se sabe a língua, se consegue pensar em Literatura e no principal objetivo da aventura? Essa é uma questão que os participantes dessa Empreitada poderiam comentar nos blogs. Torço pelo Projeto, acho válido. Mas o prazo de um mês é ridículo, no máximo dá pro cara ficar zanzando que nem um cachorro louco pelas ruas das metrópoles; não dá pra apreender a atmosfera da cidade e nem se enraizar minimamente para escrever com legitimidade tendo a metrópole como cenário. É o que eu penso. Mas tomara que dê certo para todos e produzam boas histórias! Um abraço.

12 de setembro de 2007 às 07:15  
Blogger Laís disse...

aiai, que engraçado o seu comentário!
Até o final do mês você aprende a pedir pro onibus parar...


bjjss

12 de setembro de 2007 às 08:52  
Blogger Dora disse...

pegue o primeiro avião para las vegas, assim você evita não o atraso, mas o anacronismo.

13 de setembro de 2007 às 22:10  
Blogger Saint-Clair Stockler disse...

Não consigo entender o mau humor dos (das?) comentadores deste blog. Galera, vamos dar força pro Bernardo, sô... Quanto a mim, torço pra que você, Bernardo, consiga aproveitar a estadia (curta ou não, peu importe), e que volte com algumas belas imagens para construir uma história legal, do jeito que você gosta. Força aí! E que algum dos Patriarcas russos - São Qualquer-Coisa - o proteja e o guarde!

15 de setembro de 2007 às 18:34  
Blogger ddd disse...

a coisa ai parece que tá russa heim? huahuahua
não se apoquente meu caro. Isto irá lhe inspirar a conceber um romance mais pessimista que o notas do subterrâneo...

17 de setembro de 2007 às 16:52  
Blogger Maria Guimarães disse...

você foi praí a serviço das palavras... e elas pelo visto estão caprichando!

26 de setembro de 2007 às 12:26  

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